Por Cláudia Ricaldoni* e José Ricardo Sasseron**
Uma das maiores preocupações dos participantes de fundos de pensão é com a cobertura de déficits, pois isto significa sempre aumento de contribuição tanto para a empresa patrocinadora quanto para os participantes ativos ou aposentados.
Aumentar contribuição significa reduzir o benefício líquido de aposentadoria ou reduzir o salário líquido. Ou, nos casos mais drásticos, a solução imposta pela empresa patrocinadora é extinguir o plano de benefícios deficitário e criar um novo plano de caráter financeiro, com benefícios reduzido, transferindo todo o risco para os participantes.
O participante que nos lê deve estar se perguntando: por que há fundos de pensão que têm déficits a cobrir e outros não, se todos aplicam recursos no mesmo mercado financeiro? O senso comum e a manipulação mais rasteira atribuem os déficits a falcatruas e roubo de dirigentes. Contudo, para quem quer conhecer as causas reais dos resultados negativos de seu plano sem usar o expediente fácil de jogar a culpa nos outros, esclarecemos que os déficits dos planos podem vir de inúmeras causas, tais como aumento dos compromissos dos planos, subfinanciamento, baixa rentabilidade decorrente de condições do mercado e, sim, até mesmo má gestão dos investimentos.
Vamos verificar, então, algumas questões que provocam déficit.
Prejuízos com investimentos provocam déficits e podem ser causados por mudanças profundas no mercado. Em 2020, por exemplo, o valor das ações caiu vertiginosamente, gerando déficit nos fundos que investem nesse mercado. O mesmo ocorreu em 2015, quando a bolsa caiu abaixo de 40 mil pontos. Em 2012, a taxa Selic real caiu para próximo de 1%, reduzindo drasticamente o retorno de títulos públicos de curto prazo. Fundos que aplicavam com todo cuidado nestes mercados sofreram as consequências da perda de rentabilidade que gerou déficit.
As contribuições pessoais e patronais ao plano podem ter sido mal calculadas e, quando um grande contingente começou a se aposentar, o fundo de pensão percebeu que a reserva acumulada era insuficiente e o plano, deficitário, foi obrigado a aumentar as contribuições para ter condições de cobrir os compromissos.
A expectativa de vida da população brasileira aumentou de 54,6 anos em 1970 – quando os grandes fundos de pensão começaram a ser criados – para 76,8 anos em 2020. Se as pessoas vivem por mais tempo, o fundo de pensão precisa de mais reservas para pagar benefícios por mais tempo, causando déficit a ser coberto.
Nos últimos anos os fundos de pensão tiveram que reduzir a taxa de juros atuarial, que projeta o rendimento futuro das aplicações, pois o retorno real dos investimentos tem caído. A redução gerou déficit e a solução foi aumentar as contribuições para cobrir os ganhos menores que entrarão no futuro. Cada 1% de redução da taxa de juros provoca aumentos de pelo menos 10% no volume de reservas, exigindo aumentar as contribuições.
Como normalmente as contribuições são calculadas como percentual de salários, se houver mudanças significativas na estrutura de salários da empresa patrocinadora, isto pode causar aumento nos compromissos do plano de previdência e, portanto, déficit. O mesmo pode acontecer com mudanças na estrutura familiar dos participantes, como por exemplo aumento no número de dependentes provocando aumento em eventuais pensões.
Estas são somente algumas das mais importantes causas de déficits em um plano de previdência, que precisam ser cobertos para que os compromissos com o pagamento de benefícios sejam cumpridos. A diferença dos resultados entre os planos está nas decisões dos dirigentes. Enquanto alguns implantam soluções para os problemas listados acima no tempo correto, outros postergam e só fazem crescer o déficit e o problema a ser resolvido. Enquanto alguns fundos diversificam investimentos em busca da melhor rentabilidade, outros investem quase que somente em uma modalidade e ficam expostos às oscilações de mercado.
A grande maioria dos fundos de pensão investe quase que exclusivamente em títulos públicos federais, que tiveram retorno real próximo de 1% em 2012 e depois subiram novamente. Em junho de 2022, com a inflação anual a 11,73%, a taxa real dos títulos de curto prazo estava em torno de 1%. As taxas dos títulos NTN-B com vencimento em 30 anos estão em torno de 6% ao ano mais Índice Nacional de Preço ao Consumidor Amplo (IPCA). Quem aplica no longo prazo terá, portanto, rentabilidade adequada para cobrir seus compromissos. Quem investe no curto prazo, vai provocar déficit. Isto passa por análise do fluxo de caixa e por decisão dos gestores do fundo de pensão.
Embora os participantes e a mídia de forma geral foquem nos déficits dos planos de Benefício Definido (BD), todas as questões listadas acima também impactam os planos de Contribuição Definida (CD) ou Contribuição Variável (CV). A grande diferença é que, nestas modalidades, os participantes “pagam os déficits” sozinhos, quer pela redução de seus saldos de contas, quer pelo esgotamento antecipado de seus benefícios. Ao extinguir os planos BD e impor novos planos de caráter financeiro individual, as patrocinadoras eliminam seu próprio risco e o transferem exclusivamente aos participantes.
*Claudia Ricaldoni é diretora da Regional MG/ES da Anapar e diretora eleita de Relações com os Participantes da Forluz, fundo de pensão dos empregados da Cemig
**José Ricardo Sasseron foi presidente da Associação Nacional de Participantes de Fundos de Pensão e de Beneficiários de Planos de Saúde de Autogestão (Anapar), diretor de Seguridade da Previ e diretor do Sindicato dos Bancários de São Paulo, Osasco e Região
(Publicado originalmente na Rede Brasil Atual)
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